- Leandro A. de Sousa
Ela - Uma interpretação sobre o amor

Direção e Roteiro
Spike Jonze
Elenco
Joaquin Phoenix, Scarlett Johansson, Amy Adams, Rooney Mara, Chris Pratt, Olivia Wilde, Matt Letscher, Portia Doubleday, Brian Cox, Spike Jonze, Soko, Bill Hader, Kristen Wiig, Sam Jaeger, Luka Jones e Claudia Choi.
Data de Lançamento
14 de Fevereiro de 2014 (Brasil)
13 de Outubro de 2013 (EUA)
Nome Original
Her
Nota
⭐⭐⭐⭐⭐

Ao longo de nossas vidas, nós por diversas vezes idealizamos em nossas mentes o que pode ser o amor. Existe o amor de mãe; o amor que sentimos por nossos amigos; o amor que sentimos por um bicho de estimação; o amor que sentimos por outro ser humano pelo qual nos apaixonamos; por um personagem fictício; e, se você é religioso, o amor por um Deus. Quase todas a ideias de amor que eu disse são imutáveis e até mesmo perpétuas. Nunca deixaremos de amar nosso pais; dificilmente deixaremos de amar nossos verdadeiros amigos; assim como nosso cachorro ou gato (eles nunca farão algo que desmereça de nosso amor); sempre vai haver aquele/aquela personagem de filme, série livro etc o qual você vai se importar ao ponto de chorar no momento de sua morte ou sua partida. O amor é um sentimento forte, mas o que ele é para cada um de nós, cabe a nós decidir. Não existe sentimento mais interpretativo, nem percebemos e já estamos amando.
Ela nos dá uma interpretação belíssima e diferente do que é o amor. Em uma Los Angeles de um futuro próximo, temos Theodoro (Phoenix), um homem que trabalha em uma empresa que escreve cartões comemorativos. Logo na primeira cena do filme, temos Theodoro olhando para câmera enquanto escreve o cartão que uma senhora encomendou para comemorar o aniversário de seu marido. Por mais que as palavras proferidas por Theodoro não signifiquem absolutamente nada para ele, elas significam para alguém, alguém que irá receber o cartão; para ele é falso, para esta pessoa, não (isso já nos dá uma certa previsão do que está por vir).
Então, seguindo a estória, Theodoro compra um sistema operacional onde ele pode conversar com um software ao qual responde e interage com ele como se fosse uma pessoa comum. Este sistema se auto denomina Samantha (voz de Scarlett Johansson). O interessante é a forma como o roteiro e como nós mesmos passamos a tratar esse relacionamento, que de forma alguma se parece estranho, em nenhum momento sentimos que é um relacionamento entre o humano e a máquina. Muito disso se deve ao incrível trabalho de atuação de Johansson que consegue passar para Samantha uma humanidade e naturalidade ao qual nós passamos a nos importar com ela.
O fato desse sistema passar uma espontaneidade e uma naturalidade na forma de pensar, falar e até mesmo sentir, faz com que Theodoro se apaixone por ela e que este sentimento se torne recíproco. Há também o fato do mesmo está passando por um processo de divórcio e por esse motivo ter um certo medo de se envolver em um relacionamento normal. Isso fica claro de diversas formas durante o filme, como quando ele sai com uma mulher para um encontro às cegas e ela pergunta se ele gostaria de algo sério, nesse momento ele reluta e cada um segue o seu caminho.
Um dos pontos interessantes do filme e que nos fala ainda mais do medo de Theodoro de relacionamentos é apresentado de forma simbólica por Amy (Adams), amiga de Theodoro que é casada com Charles (Letscher). Amy está sempre vestida de cores cinzentas e sempre tem uma aparência cansada e impaciente e quase a todo momento está se auto criticando ou brigando com seu marido. Quando estes se divorciam, Amy entra em estado de negação e repete para Theodoro e para si mesma que simplesmente não se importa com isso. O roteiro reforça isso quando descobrimos que Charles morre apenas em uma linha de diálogo de Amy com Theodoro, sequer tendo o trabalho de detalhar ou de mostrar o que houve.
A decepção amorosa é comum a todos, assim como o medo da responsabilidade também. O que Theodoro vê em Samantha é quase uma forma de evitar ambas as coisas, mas o filme acaba por tomar caminhos diferente e Samantha se torna tão real quanto um ser vivo. Ora, por que não seria?
Uma pergunta que o filme traz a tona é: o que é real? até onde um sentimento pode ser real ou programado? Isso é respondido por nós mesmos. Tudo o que sentimos em relação aos personagens do filme é real. Por diversas vezes eu me peguei sorrindo ao ver a relação de ambos como quando eles estão no parque e Samantha guia Theodoro até uma barraca para que ele se alimentasse. O que senti nesse momento foi real, senti uma alegria por duas pessoas que sequer existem - no caso de Samantha, duas vezes isso. Ainda sim, posso dizer que foi verdadeiro (Claro que no cinema tudo é manipulação, e se eu senti isso, foi porque Spike Jonze quis que sentisse).
Um relacionamento a distância não se torna menos válido somente porque ambas as partes nunca ou quase nunca se encontram, em Ela a necessidade física ao qual uma pessoa como Theodoro tanto requer é substituída por um sentimento de que Samantha está ali, então ambos projetam a imagem um do outro em seus próprios domínios. E a química entre esses personagens é tão forte e tão real que não temos outra escolha a não ser abraçar a ideia e acompanhar o desenrolar da estória.
E como eu disse, a estória resolve tomar um rumo diferente. A aceitação é um dos processos mais dolorosos pelo qual todos nós passamos. Theodoro, como já dito, tem medo de ter um relacionamento normal, pois ele está passando por um processo de divórcio demorado. Uma coisa a se destacar é como todos ao redor dele tratam Samantha como uma pessoa normal, em nenhum momento discriminando esse relacionamento ou julgando Theodoro. Exceto Catherine (Mara), a ex-mulher de Theodor. Em uma conversa no momento da assinatura dos papéis do divórcio, ela fica não só surpresa mas indignada com o fato dele estar namorando um sistema operacional, dando a entender que foi ele que pedira a separação. E isso deixa a natureza tímida e até um pouco medrosa de Theodoro ainda mais clara, já que o filme só nos mostra momentos desse casamento em flashbacks mudos. Tais flashbacks molduram perfeitamente o que é um relacionamento, pois sempre estão mostrando os momentos felizes como no qual eles se mudam para um apartamento, e os tristes, como quando mostra uma discussão de ambos na frente de um juíz.
Pode-se dizer que Ela ao mesmo tempo que é sensível é um pouco assustador. Sensível pois nos toca de uma forma extrema nos lembrando de tudo o que vivemos em relação a esse sentimento tão forte. Assustador, pois ele não termina de uma forma feliz, além de se passar em um futuro tão próximo e plausível, nos mostrando como deve ser os relacionamentos humanos em poucos anos. Ele nos mostra o lado doloroso e real de um relacionamento de ambas pessoas tão distintas, que mesmo que se amem, há sempre o momento de dizer adeus. Ainda sim, não podemos deixar de desfrutar desse doloroso, mas belíssimo e doce sentimento.
Sobre o Autor:

Leandro A. de Sousa, 18 de Maio de 1998, co-fundador e editor do Fala Objetiva. Adora estudar sobre montagem, fotografia e mixagem de som, mas tem dificuldades de passar isso para um texto por medo de falar bobagem. Ainda explorando essa incrível sétima arte, mas tem uma ligação mais forte com as séries de TV. Aspirante a Crítico de Cinema e a escritor de Livros que provavelmente só vão ser conhecidos por seus amigos e familiares. Ama o que faz, mesmo que ninguém partilhe desse amor. Twitter: _leandro_sa Instagram: leandro.as