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  • Leandro A. de Sousa

Crítica | A Forma da Água (2018)


Direção

Guillermo del Toro

Roteiro

Guillermo del Toro & Vanessa Taylor

Elenco

Sally Hawkins, Michael Shannon, Richard Jenkins, Doug Jones, Octavia Spencer, Michael Stuhlbarg, Lauren Lee Smith, Nick Searcy, David Hewlett, Nigel Bennett, Dru Viergever, John Kapelos, Morgan Kelly, Cyndy Day, Madison Ferguson, Jayden Greig, Marvin Kaye, Jim Pagiamtzis, Cameron Laurie, Alexey Pankratov, Shane Clinton Jarvis, Deney Forrest e Evgeny Akimov.

Data de Lançamento

01 de Fevereiro de 2018 (Brasil)

01 de Dezembro de 2017 (Exterior)

Nome Original

The Shape of Water

Nota

⭐⭐⭐⭐⭐
 

Guillermo del Toro é uma das mentes mais criativas de Hollywood. Mais do que isso, é um diretor que encontra a sensibilidade nos locais mais obscuros da humanidade e os transforma em poesia pura. Isso já foi comprovado em filmes como A Espinha do Diabo, Labirinto do Fauno e até mesmo na sua adaptação de Hellboy. Aliás, esses 2 últimos filmes conversam muito com o seu novo longa, A Forma da Água, que conta a história de um romance que poderia entrar nos moldes de A Bela e a Fera, mas as cenas de nudez e violência intensa não permitem que ele seja um clássico Disney.

Em seu início, A Forma da Água demonstra a sensibilidade de seu autor, ao nos dizer em poucas palavras, somado a um belíssimo plano longo, o que seria esse filme como um todo: um filme sobre uma princesa sem voz, que teve seu dom roubado ainda muito nova, mas isso lhe dera a ternura que só pode ser explicada pelos gestos que a mesma faz através da linguagem de sinais. Há um monstro na história, aquele que procura dominar e destruir tudo.

Com uma trilha sonora doce e uma fotografia com cores frias e chapadas que se justapõe à delicada música que ouvimos, ao passo em que se encontra com a época na qual nos encontramos, conhecemos Elisa (Hawkins). Em planos curtos, organizados em uma edição rápida, presenciamos todo o processo dela para se preparar para o seu trabalho. Del Toro reforça sua sensibilidade ao compreender que mesmo alguém com uma deficiência possui desejos sexuais. Onde a maioria pensa em Elisa como um ser quase assexuado, até mesmo devido ao seu olhar delicado, Del Toro mostra em uma cena rápida a personagem se tocando dentro da banheira de sua casa. Dessa forma, o diretor também introduz a ideia que mais tarde seria melhor explorada no longa, simbolizada também pelo ovo, um signo simples, que estabelece a amizade entre Elisa e a Criatura (Jones).

Elisa trabalha em uma base de pesquisas do governo dos EUA como faxineira e, por ser muda, recebe ajuda constante de sua amiga Zelda (Spencer), uma personagem tão carismática e de bom coração quanto a atriz que a interpreta. Octavia confere a sua personagem graça e sagacidade, se tornando um alívio cômico não só eficiente, mas uma personagem importante para o desenvolvimento de Elisa e da história. Zelda é uma personagem que tem um papel fundamental, em uma vertente importante da narrativa que Del Toro resolve explorar no seu longa, que fica exposto ao longo do filme.

Algo que sempre chama a atenção nas produções de Del Toro é a capacidade de realismo. Com um Design de Produção e Direção de Arte fabulosos, as produções do autor são capazes de compor criaturas fantásticas de um modo palpável. O maior exemplo disso, podemos ver em O Labirinto do Fauno, onde boa parte dos seres são feitos através de maquiagem e implantes (vide o aterrorizante Pale Man). A Criatura que vemos em A Forma da Água, é feita aos moldes de Abe, de Hellboy (também interpretado por Doug Jones, que já é especialista neste tipo de papel). E isso me leva a crer que Del Toro tenta aqui fazer uma homenagem a sua própria obra, colocando elementos de dois dos seus filmes mais populares (O Labirinto do Fauno, sendo sua Magnum Opus), e elevando a escala.

Eleva a escala ao também mostrar que ali ele está basicamente nos falando da diversidade e do preconceito, ao colocar Gilles, um personagem homossexual, melhor amigo de Elisa e um sujeito que se torna mais interessante ao passar da projeção, pois o roteiro permite que mergulhemos em sua solidão, que somente é preenchida por sua arte, pela música, pelos filmes e por Elisa, aonde os dois protagonizam algumas cenas que são poesia pura (como aquela, na qual ambos improvisam um sapateado enquanto estão sentados no sofá). Gilles, junto a Zelda, são dois personagens que escancaram o preconceito incidente de uma época de repreensão nos EUA, ambos de extrema importância para a narrativa. Mas para que isso ficasse ainda mais evidente, precisamos de Richard (Shannon), chefe de segurança do local onde Elisa trabalha

Richard é um homem de família, obsessivo por ser competente, e extremamente autoritário (isso explica cenas onde ele está fazendo sexo com sua esposa e coloca a mão na boca para que a mesma não fale, reforçando seu caráter dominante), algo que se corrobora ao vermos sua relação de puro ódio pela Criatura, que só pode ser explicada pelo medo. Medo esse que Elisa decide deixar de lado ao ver essa criatura não como um simples animal, e sim como um ser humano.

A relação de ambos é que faz o filme respirar. Os ovos - como eu disse no começo - que Elisa entrega a essa criatura, estabelece uma confiança entre ambos; ao dançar para ele, fingindo que está limpando o laboratório onde ele está preso, demonstra o interesse; não só isso, finca o sentimento de amizade, reforçado pela música que ela leva até o anfíbio.

Ah, a música. Alexandre Desplat (responsável por excelentes trilhas como O Grande Hotel Budapeste e A Árvore da Vida) compõe sua trilha sonora de forma tão magnífica que se sentir indiferente às músicas da época e não dar um sorriso se torna uma tarefa herculana. Desplat torna a experiência do longa mais interessante no momento em que sua composição nos acompanha em momentos sublimes e determinantes.

Aos poucos, o laço de Elisa vai sendo criado, e para que ele se estabeleça por completo, é preciso que haja confiança total, até mesmo no que a moça está prestes a fazer. Cenas como na qual ela toca um disco vinil para o anfíbio, ou ensina o mesmo a palavra "música" em libras, demonstram a pureza de um romance que nasceu em situações totalmente adversas. O monstro do filme não é aquele capaz de respirar debaixo da água; ele usa paletó e um bastão de choque. Richard sente ódio da Criatura, não por ela ser um simples "atentado" à criação, mas por não conseguir domá-la; e isso apenas machuca o seu ego, que é totalmente dizimado quando a Criatura arranca seus dois dedos. É interessante notar, que ao tentar recosturar os membros perdidos, o apodrecimento vem a simbolizar tanto Elisa quanto a Criatura, estando cada vez mais distantes de suas mãos.

O romance que Guillermo del Toro cria aqui é tão fantástico quanto qualquer outro conto de fadas, mas que encontra seu fundo de veracidade nas questões sociopolíticas que o diretor escancara devido à época na qual sua história se passa. Sim, o filme tem um final feliz, e isso nos deixa alegres. Elisa e a Criatura se reencontram em seu habitat novamente. A princesa retorna ao seu reino.

E todos foram felizes para sempre.

Sobre Autor:

Leandro A. de Sousa, 18 de Maio de 1998, co-fundador e editor do Fala Objetiva. Ama estudar o Cinema em todos os seus aspectos. Sabe que ainda tem muito o que aprender, tanto no que diz respeito à Sétima Arte quanto à escrita, tendo como principal inspiração nessas áreas o grande Roger Ebert. Aspirante a Crítico e Diretor/Roteirista de filmes de baixo orçamento (perceba como ele tem vontade de passar fome). Ama o que faz, mesmo que ninguém partilhe desse amor.

Twitter: _leandro_sa

Instagram: leandro.as

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