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  • Foto do escritorMatheus Oliveira

Crítica | Belfast (2021)


Direção

Kenneth Branagh


Roteiro

Kenneth Branagh


Elenco

Jamie Dorman, Caitriona Balfe, Ciarán Hinds, Jude Hill, Judi Dench, Colin Morgan, Lara McDonell, Olive McDonald


Data de Lançamento

10 de Março de 2022 (Brasil)


Nota do Crítico

⭐⭐


 


Crítica | Belfast (2021)

Saudosismo alienante? Crítica sociopolítica à religião na Irlanda? Comentário sobre a modernização urbana (daí a razão daquela transição introdutória que muda o colorido atual para o nostálgico P&B)?


Não sei ao certo o que é Belfast. É um desses filmes que parecem profundos, "ecléticos", que carregam um corpanzil discursivo que discute de tudo um pouco - e desse ecletismo tira um todo riquíssimo.

Só que na verdade se trata do oposto: é um filme raso; e o ecletismo, ilusório. Aqui os assuntos se misturam, confundindo-se uns com os outros. Aliás, não bem se confundindo. A palavra não é essa. Criam-se na verdade forçadas relações com temas lá e cá - falsas simetrias. Discute-se por exemplo a Verdade sendo posta à prova mediante a diferença doutrinária entre o Protestantismo e o Catolicismo, sob a ótica do panorama social da Irlanda retratada. O líder religioso prega o tal "caminho bifurcado", dando a entender que este mesmo caminho é o da dicotomia Céu-Inferno. Depois, desce-se do contexto teológico, e então a ideia da bifurcação é transferida ao contexto social: nossos queridos protagonistas, os protestantes tolerantes, precisam tomar um rumo na vida (em especial o menino bestinha e sorridente, Buddy, exaustivamente mostrado em close-ups) - precisam aliás abandonar a vida provinciana, saber que existe outro mundo lá fora e que não precisam esquentar em serem vistos como aberrações. Sumamente: mudança de dentro para fora, questão interna que dá lugar à externa.


Daí vêm duas dicotomias.


A primeira: vida provinciana (refletindo "atraso", que de certo modo rima com "atraso religioso") x vida cosmopolita (refletindo "avanço", "vida lá fora", que rima com a aceitação de um mundo mais vasto, religiosamente falando). A segunda: intolerância (onde só uma religião está certa e a outra errada) x tolerância (onde existe espaço para a crença do outro). Estas dicotomias misturam-se por semelhanças não tão semelhantes e são enfim regidas pela mensagem reducionista do amor-cura-tudo: esta mensagem é entregue através do menino apaixonado Buddy, representando o olhar ingênuo que observa prematuramente ao seu redor o mundo confuso que se modifica; reforçada por seu avô, a voz moral; e gritada, "expelida" pela vó, ao fim do filme, naquela fala expositiva e em close.


E por falar em close - ângulo aqui exaustivamente usado -, algumas observações abaixo.

Tal mistureba não seria possível sintetizar se antes Kenneth Branagh, o diretor, não se utilizasse de apelativos meios técnicos para conquistar a simpatia do espectador. Um deles, e o mais evidente, é o P&B. Tal artifício aliás já valoriza o filme: dá-lhe um aspecto arthouse. Concretiza também a ideia de nostalgia, mas contrapondo-a à de realidade. Noutras palavras: estabelece a ambivalência arraigada à vida, mas não se esforça para torná-la mais complexa em termos de obra de arte. E não a complexifica porque não há uma articulação elaborada para fazê-lo. É que por si só o P&B não constrói nada - descolore, apenas. Também não ajudam em nada os ângulos genéricos de câmera que lembram as fotografias de um Cartier-Bresson em seus detalhes mais superficiais.


Quiseram por acaso registrar algo esquecido que combine com o filme e com a vida nele retratada? Não sabemos. Única coisa sabida é que tudo é meio genérico.


Genérico pelo seguinte: a câmera na maior parte do tempo é posicionada de um jeito que nada diz, mas que parece querer dizer: para quê então, em determinadas partes, ao se ter um diálogo entre dois ou mais personagens, põem-se nos cantos dos quadros os atores e as atrizes, deixando nos cantos opostos um enorme e desfocado espaço, sugerindo sei lá o quê. Emulando o estilo transcendental? Duvido muito. Emulando Béla Tarr, Pawlikowski? Também duvido. Não parece existir tamanha ambição porque não se visualiza no terreno do filme espaço para empreitada deste tipo. É estetismo vazio, fetichista. É coisa para ganhar premiação.


Aliás, por falar nisso, enfim temos a música. A trilha de Van Morrison, alegre e virtuosa (aliás indicada este ano ao Oscar) é no entanto manipulativa. Completa uma poderosa dupla, chamariz para premiações: música-fotografia. Reforça o que imageticamente o filme diz - e o que é dito não é grande coisa.


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